terça-feira, 29 de outubro de 2013

30 ANOS DO PROGRAMA DE DST/AIDS DE SP




30 ANOS DO PROGRAMA DE DST/AIDS DE SP: “Trabalhar com aids ensina muito sobre a vida e o amor”, diz a médica Naila Janilde


28/10/2013 - 21h

Aprendizado. Essa é a palavra que a médica Naila Janilde Seabra Santos acha que melhor define seus 24 anos na equipe do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo. Ela é uma das funcionárias mais antigas do prédio da Rua Santa Cruz e, por isso, foi escolhida para conversar com a Agência Aids sobre os 30 anos do Programa comemorados neste mês – o evento para celebrar a data acontece desta terça-feira (29) até quinta (31).

Naila começou no Programa em agosto de 1989, na primeira década da epidemia da aids. Mãe de três filhos, Guilherme (28 anos), Rafael (21) e a caçula Ana Clara (15), sempre conciliou as funções de mãe e mulher de um professor de matemática, com as atividades como médica, pesquisadora e colaboradora da equipe de prevenção do Programa.

Formada pela Universidade de Campinas (Unicamp), Naila fez residência na Santa Casa de São Paulo e mestrado e doutorado na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). O seu primeiro desafio no Programa foi supervisionar a equipe de vigilância epidemiológica. “No início da epidemia, era tudo muito diferente. Ter aids era trágico, as pessoas morriam. A tecnologia avançou, os medicamentos estão melhores e a mortalidade diminuiu”, observa ela, hoje assistente de direção da Gerência de Prevenção do Programa e médica clínica no Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids de São Paulo.

Proximidade e compaixão


Nayla fica emocionada ao descrever como é o seu trabalho. “Ele ensina muito sobre a vida e o amor”, diz. “Aqui, podemos observar como as pessoas vivendo com HIV e aids sofrem discriminação e preconceito. A gente se aproxima delas e reconhece o sentimento e a dor, sente como é injusto alguém ser discriminado”, continua. “Aprendi o que é compaixão, a olhar o outro e enxergá-lo.”

Naila acredita que a marca do Programa Estadual nestes 30 anos é o acolhimento. “Os pacientes são bem recebidos aqui, sempre trabalhamos na linha do não preconceito e da não discriminação. Não vou ser tão romântica a ponto de achar que 100% dos profissionais seguem nossas orientações no Estado. Pode ter acontecido alguma situação de preconceito, mas de modo geral sempre atendemos da melhor forma possível.”

Sobre o dia a dia no Programa, Naila conta que sua equipe não segue uma rotina definida. “Trabalhamos com a capacitação da rede de saúde, vamos para o interior conversar sobre tecnologias de prevenção, elaboramos materiais informativos, cartilhas...”

Aids e mulher 

O aumento de casos de aids entre mulheres incentivou a especialista a pesquisar sobre a vulnerabilidade e a feminização da doença em suas teses na universidade. “No mestrado, fiz um estudo sobre o perfil das mulheres identificadas com aids entre 1983 e 1994.” Nesse momento da entrevista, Naila se emociona ainda mais e chora. “Minha pesquisa ajudou a ver quais fatores estavam levando à feminização da epidemia. Entrevistei algumas soropositivas para saber a história de vida delas. Naquela época, a sociedade considerava que elas se infectavam porque transavam muito e tinham inúmeros parceiros. Mas comprovei o contrário. Muitas eram casadas e adquiriram aids do parceiro fixo. Lembro de uma paciente que disse assim: ‘Eu sei como e onde eu peguei aids. Foi do homem que eu amo, dentro da minha casa´.”, conta Naila.

Segundo a médica, a paciente já morreu, ela era mãe e os filhos não foram infectados. Histórias como levaram Naila a estudar as mulheres soropositivas e seu desejo de engravidar. “Elas têm o mesmo desejo reprodutivo de todas as mulheres e o avanço da tecnologia na transmissão vertical ajuda muito na realização do sonho de ser mãe.”

Dificuldade na prevenção

Naila acredita que, hoje em dia, todo mundo sabe qual é o risco de não usar camisinha. Mas entre saber e evitar há uma grande distância. “Todo mundo sabe que o cigarro faz mal e, ainda assim, as pessoas fumam. Transar sem camisinha é mesma coisa”, continua. “A nova geração não viveu a fase complicada da aids. Não é à toa que os dados mostram que a doença está aumento na população de jovens gays e isso não é falta de informação.”

Para ela, depois de 30 anos, o programa de aids ainda tem desafios. “Temos de insistir cada vez mais no diagnóstico precoce. Eu acredito que a cura da doença vai chegar em alguns anos, mas enquanto isso temos de nos prevenir.”

Travestis e Transexuais

Toda sexta-feira, Nayla dedica três horas e meia do seu tempo para atender travestis e transexuais no ambulatório. “Eles são uma população vítima de muito preconceito e discriminação. Chegam aqui com uma ansiedade de serem bem aceitos e atendidos. E nós damos o suporte necessário. Tem pacientes que vem aqui só para bater um papo."

Nas horas vagas, Naila  diz que gosta de dormir. E, nos fins de semana, seu passatempo predileto é ver filmes. “Vi dois filmes interessantes nos últimos tempos, `Intocáveis` e `Um Sonho Possível`. Passear na praia ou no interior também estão entre os  programas que eu gosto de fazer. Bater pernas é comigo mesma.” E ninguém mais que essa incansável trabalhadora que ajudou o Programa a ser referência no combate à aids merece os sagrados momentos de lazer!

Talita Martins

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